“Fica concedido o título de Cidadão Paulistano ao sr. Marcelo Odebrecht pela sua dedicação às causas sociais e dos trabalhadores, luta e sacrifício pela democracia, defesa das liberdades civis e restauração do Estado de Direito.” Assim dizia um decreto da Câmara Municipal de São Paulo assinado em 2011 concedendo a honraria ao herdeiro da empreiteira, preso desde 2015.
Seis anos depois, o autor da sugestão de homenagear o empreiteiro está sendo processado pelo Ministério Público sob acusação de receber caixa dois da empresa. Então vereador pelo PT, Francisco Chagas propôs o título a Marcelo Odebrecht por “promover emprego e renda” para a cidade e por ser uma “jovem liderança empresarial”. Até a construção do estádio do Corinthians, tocada pela empreiteira na zona leste, foi listada por ele na época como justificativa.
Na última terça (19), dia em que Marcelo enfim deixou a cadeia no Paraná e passou ao regime domiciliar, o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou uma ação civil contra Chagas -e contra a Odebrecht- por suposto pagamento de caixa dois. A delação apontou pagamento de R$ 30 mil na campanha de 2010, na eleição dele para deputado federal, sob o codinome “Campinas”. Para os promotores, esses repasses configuram improbidade administrativa.
A Odebrecht fez um acordo com o Ministério Público paulista em que se comprometeu a pagar aos cofres públicos quantias equivalentes às repassadas via caixa dois. O promotor Valter Santin chamou o processo de “simbólico” pelo valor baixo, se comparado a outros casos relativos à empreiteira.
A sessão solene na qual o empreiteiro recebeu o título ocorreu em 2 de agosto de 2012 no salão nobre da Câmara paulistana. O então prefeito Gilberto Kassab (PSD) compareceu, chamou Marcelo de “homem exemplar e referência” e posou para fotos com ele. Kassab, hoje ministro do governo Michel Temer, também se tornou alvo na semana passada de ação de improbidade dos promotores paulistas, que o acusam de receber R$ 21,2 milhões em caixa dois da Odebrecht -ele nega. Vereadores tentam revogar a homenagem
A Odebrecht fez ainda doações oficiais a campanhas de Chagas por meio da Braskem. Em 2014, a empresa foi a principal doadora de sua campanha a deputado federal, com R$ 381,5 mil pagos. Também doou R$ 30 mil na eleição de 2008. A reportagem procurou o ex-vereador desde quinta (21), mas não conseguiu contatá-lo. Segundo o Ministério Público, Chagas foi ouvido durante a investigação e negou ter cometido irregularidade.